
Em voto divergente no STF, Luiz Fux sustenta que os manifestantes de 8/1 não dispunham de meios concretos para executar golpe e só poderiam ser responsabilizados por crimes patrimoniais
Por Paloma de Sá | GNEWSUSA
Num dos momentos mais relevantes do julgamento da Ação Penal 2668 no Supremo Tribunal Federal (STF), o ministro Luiz Fux abriu divergência ao afirmar que os manifestantes que invadiram os prédios dos Três Poderes em 8 de janeiro de 2023 não configuravam uma ameaça real à democracia brasileira. Segundo seu entendimento, não era razoável imaginar que civis desarmados, organizados de forma difusa e com recursos limitados, pudessem possuir articulação, coordenação, fôlego financeiro ou capacidade bélica para derrubar o Estado Democrático de Direito. Em seu voto, Fux propôs que os acusados sejam condenados por danos ao patrimônio, mas absolvidos das acusações de golpe de Estado e abolição violenta do regime democrático — sustentando que os artigos penais específicos devem ser interpretados de modo restrito, apenas diante de risco concreto e efetivo de tomada de poder.
Contexto e fundamentação do voto de Fux
1. A Ação Penal 2668 e o julgamento no STF
A Ação Penal 2668 é o processo que apura a tentativa de golpe de Estado e outras práticas conexas em razão das manifestações de 8 de janeiro de 2023, envolvendo réus acusados de crimes como organização criminosa armada, tentativa de golpe, abolição violenta do Estado Democrático, além de danos e deterioração de patrimônio público tombado.
O relator é o ministro Alexandre de Moraes, que já votou pela condenação dos réus com base na narrativa de que havia um plano organizado de ruptura institucional.
O voto de Fux, apresentado após pedir vista em maio, foi lido em sessão extensa e se posicionou de forma contrária à tese apresentada pela Procuradoria-Geral da República (PGR) — que sustentava que as ações de 8/1 configuraram tentativa de golpe e abolição violenta do regime.
2. Principais argumentos de Fux
a) Inexistência dos requisitos objetivos para golpe político
Fux enfatizou que, para se caracterizar o crime de golpe ou abolição violenta da democracia (artigos 359-L e 359-M do Código Penal), é necessário mais do que palavras ou intenções: exige-se organização mínima, meios materiais, coordenação e risco efetivo de tomada de poder. Para ele, os réus descritos no processo não preencheram esses requisitos.
Ele escreveu:
“Não é razoável imaginar que manifestantes desarmados, recolhendo recursos entre si para viajar em ônibus fretado, teriam articulação, fôlego financeiro, treinamento e capacidade bélica suficientes para organizar um golpe de Estado ou abolir violentamente o Estado Democrático de Direito.”
Fux ainda advertiu que admitir uma interpretação expansiva desses dispositivos penais seria “desprezar as instituições brasileiras, esgarçar os limites semânticos da lei penal e descartar o princípio da lesividade”.
b) Interpretação restritiva da lei penal e princípio da legalidade
Para o ministro, os artigos penais relativos a golpe só podem ser aplicados em situações onde haja risco concreto de subversão institucional — não bastam manifestações, mesmo violentas, caso não carreguem lógica estrutural de tomada do poder. Assim, ponderou que as condutas denunciadas, ainda que graves, não se prestariam a sustentar acusações políticas dessa natureza.
c) Responsabilidade pelos danos materiais
Mesmo rejeitando a tipificação como crimes contra a ordem democrática, Fux reconheceu que houve deterioração patrimonial e danos a bens públicos tombados, devendo os réus responder por isso com base no artigo 163 do Código Penal e na Lei 9.605/1998 (regulação de crimes ambientais).
Ele propôs penas mais brandas — por exemplo: um ano e seis meses de prisão + 50 dias-multa para três dos acusados — e absolvição de uma das rés (Cristiane Angélica Dumont Araújo).
d) Crítica aos excessos e à pressa na punição
Fux advertiu que o papel do Judiciário exige prudência e serenidade, mesmo em casos de forte comoção social. Ele defendeu que o tempo deve permitir correções de eventuais excessos cometidos sob o impacto de pressão política ou emocional. Em seu voto, citou o jurista Felix Frankfurter: “a sabedoria … não deve ser rejeitada simplesmente porque chega tarde”.
Outra crítica sua recaiu sobre aspectos processuais: ele manifestou dúvidas sobre competência (foro), local do julgamento (Plenário x Turma), e alegou que a defesa não teve tempo adequado para se preparar diante da vasta documentação juntada.
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