Molécula descoberta em aranha da Amazônia pode combater fungos resistentes

Foto: Comunicação Butantan
Pesquisadores identificam substância natural com ação antifúngica e baixo risco de toxicidade; descoberta abre caminho para novos medicamentos e reforça alerta sobre resistência microbiana
Por Paloma de Sá | GNEWSUSA

Uma molécula presente no sangue da aranha Acanthoscurria rondoniae, espécie de tarântula encontrada na região amazônica, pode se transformar em uma poderosa aliada contra fungos resistentes aos medicamentos atuais. A descoberta é resultado de uma pesquisa conduzida pelo Instituto Butantan e publicada na revista In Silico Pharmacology.

Batizada de rondonina, a molécula apresentou resultados promissores em testes laboratoriais (in vitro) e em animais (in vivo), eliminando fungos dos gêneros Candida e Trichosporon, sem causar danos significativos às células humanas. Segundo os pesquisadores, o composto atua de forma seletiva, o que reduz o risco de toxicidade — um dos grandes desafios no desenvolvimento de novos antifúngicos.

A cada ano, os fungos infectam cerca de 6,5 milhões de pessoas em todo o mundo, sendo responsáveis por 2,5 milhões de mortes. O aumento dos casos de infecções resistentes preocupa cientistas e órgãos de saúde. A Organização Mundial da Saúde (OMS) alerta que a resistência antifúngica é uma das maiores ameaças emergentes à saúde pública global.

A rondonina vem sendo estudada desde 2012 pelo grupo liderado por Pedro Ismael da Silva Junior, do Laboratório de Toxinologia Aplicada do Butantan. A molécula é um fragmento da hemocianina — proteína presente na hemolinfa (sangue) da aranha — e foi inicialmente caracterizada pela bióloga Katie Cristina Takeuti Riciluca, atualmente pós-doutoranda na instituição.

Mecanismo de ação e testes computacionais

Em testes realizados no Butantan, a rondonina demonstrou maior eficácia contra fungos unicelulares, como os do gênero Candida, conhecidos por causar infecções graves em pacientes imunodeprimidos. Entre eles está o Candida auris, um dos patógenos mais preocupantes do mundo, com taxa de mortalidade de até 66% em pacientes internados em UTI.

Para entender como a rondonina atua, os cientistas realizaram simulações computacionais. O biomédico Elias Jorge Muniz Seif, orientando de Pedro Ismael, construiu o modelo tridimensional da molécula e testou seu encaixe com diversas proteínas fúngicas. O estudo identificou dois alvos principais: uma proteína de membrana externa (por onde a molécula penetra no fungo) e outra associada ao DNA do patógeno. A hipótese é que a rondonina age diretamente sobre o material genético do fungo, impedindo sua reprodução.

“O fato de a molécula ser específica para os fungos e não para células humanas sugere um alto potencial terapêutico e segurança no uso”, explicou Elias.

O próximo passo da pesquisa é validar esses resultados por meio de experimentos de bancada. “A biologia computacional ajuda a reduzir custos, acelerar os estudos e minimizar o uso de animais em pesquisa”, destacou o pesquisador.

Potencial além da ação antifúngica

Os cientistas também descobriram que pequenas modificações na estrutura da rondonina podem gerar novos efeitos terapêuticos. Em um estudo paralelo, o grupo do Butantan criou um fragmento menor da molécula, chamado RondH, que apresentou atividade antitumoral. Em modelos animais, o novo peptídeo reduziu o desenvolvimento de metástases em casos de melanoma, um tipo agressivo de câncer de pele.

“A atividade antimicrobiana é só o começo. Quando encontramos uma molécula eficiente e segura, é comum que ela apresente outras propriedades terapêuticas importantes”, explicou Pedro Ismael, que atua há mais de 30 anos na busca por compostos bioativos em organismos da natureza.

A ameaça crescente da resistência antifúngica

A resistência antimicrobiana — que inclui fungos, bactérias e vírus — é responsável por cerca de 2 milhões de mortes anuais e pode chegar a 8,2 milhões até 2050, segundo a OMS. O uso inadequado de antibióticos e antifúngicos, tanto em humanos quanto na agropecuária, é um dos principais fatores que aceleram o surgimento de microrganismos resistentes.

Para a OMS, o enfrentamento desse desafio exige uma abordagem integrada, que envolva os setores de saúde, meio ambiente e produção de alimentos. O avanço de pesquisas como a conduzida pelo Butantan representa um passo essencial na busca por alternativas eficazes e sustentáveis para o controle de infecções emergentes.

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