Mesmo controladas, infecções como peste bubônica, hanseníase e cólera seguem surgindo em surtos localizados e expõem desigualdades no saneamento e no acesso à saúde
Por Paloma de Sá | GNEWSUSA
A confirmação recente de um caso de peste bubônica nos Estados Unidos reacendeu um alerta global: doenças consideradas “do passado” nunca desapareceram totalmente. Mesmo controladas, infecções como peste, hanseníase e cólera continuam circulando em várias regiões do mundo, principalmente onde há falhas de saneamento, pobreza e pouca vigilância epidemiológica.
Uma ameaça histórica que nunca foi embora
A peste bubônica — que matou até 200 milhões de pessoas na Idade Média — ainda existe.
A bactéria Yersinia pestis mantém focos naturais em diversos países e, segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), entre 2019 e 2022 foram registrados 1.722 casos e 175 mortes, principalmente na África.
A República Democrática do Congo segue como região mais endêmica, seguida por Madagascar, China, Mongólia, Uganda e Estados Unidos.
O Brasil não registra casos desde 2005, mas áreas como a Região Serrana do Rio e o Semiárido do Nordeste ainda são consideradas zonas de risco pela OMS.
A infectologista Christiane Reis Kobal, do Hospital Israelita Albert Einstein, explica o motivo:
“A prevalência dessas doenças está diretamente ligada à desigualdade socioeconômica, à falta de saneamento adequado e à ausência de vacinas eficazes para eliminá-las.”
Por que essas doenças persistem?
Segundo especialistas, vírus, bactérias e fungos têm um objetivo básico: sobreviver.
Eles evoluem, se adaptam e encontram formas de driblar os mecanismos de defesa do organismo humano.
O epidemiologista Expedito Luna, da USP, reforça:
“Em toda a história da humanidade, conseguimos erradicar apenas uma doença: a varíola. Qualquer outra infecção ainda pode ressurgir se houver condições favoráveis.”
As doenças medievais que ainda circulam
1. Peste bubônica
Sintomas: febre alta, dor intensa, náuseas e ínguas que podem ficar roxas ou pretas.
Transmissão: pulgas de roedores infectados.
Antibióticos modernos reduzem a gravidade da doença, mas a vigilância caiu em muitos países.
No Brasil, a descentralização das ações de controle após os anos 2000 aumentou o risco de subdiagnóstico, já que poucos profissionais reconhecem rapidamente o quadro.
2. Hanseníase (antiga lepra)
Mais antiga que muitas civilizações, a hanseníase segue endêmica em países em desenvolvimento — inclusive no Brasil.
Em 2024, o mundo registrou 172.671 novos casos, sendo 22.129 apenas no Brasil, o segundo maior número global.
Sintomas incluem:
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manchas claras, vermelhas ou marrons
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formigamento em mãos e pés
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perda de força muscular
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nódulos pelo corpo
O tratamento é gratuito pelo SUS, mas pode durar de seis meses a um ano.
Segundo a OMS, o diagnóstico tardio é a principal barreira para reduzir a transmissão.
3. Cólera
A cólera continua sendo uma das doenças mais associadas à falta de saneamento básico.
Em 2025, só entre janeiro e agosto, a OMS registrou 462.890 casos e 5.869 mortes em 32 países.
Crises humanitárias — guerras, enchentes, conflitos armados — favorecem a expansão da bactéria Vibrio cholerae.
Apesar de existir vacina oral, a cobertura é baixa: o estoque mundial em 2025 era de apenas 2,6 milhões de doses, metade do necessário para emergências.
No Brasil, não há casos autóctones desde 2006.
A chave para evitar novos surtos está nas desigualdades
Saneamento básico, água potável e acesso a medicamentos são as medidas mais eficazes para manter essas doenças sob controle.
Para Kobal, isso explica por que essas infecções persistem:
“Os agentes infecciosos fazem parte dos ecossistemas. Eles não desaparecem. Mas com prevenção adequada, podem ser controlados, mesmo que não totalmente erradicados.”
As doenças da Idade Média não ficaram nos livros de história.
Elas ainda convivem conosco — e continuam fazendo vítimas em regiões vulneráveis.
O problema, segundo os especialistas, não é a volta de doenças antigas, mas a permanência das desigualdades que permitem que elas circulem.
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