Estudos recentes revelam níveis alarmantes de mercúrio em povos indígenas. Especialistas defendem que a solução passa por infraestrutura, tecnologia limpa, fiscalização e alternativas de renda — incluindo a formalização rigorosa do garimpo para evitar a devastação causada pela atividade ilegal
Por Paloma de Sá | GNEWSUSA
A intoxicação por mercúrio entre povos indígenas da Amazônia atingiu níveis extremos e se tornou uma das mais graves emergências socioambientais do país. Pesquisas recentes da Fiocruz, ABIN, WWF e Ministério dos Povos Indígenas comprovam que comunidades inteiras, como os Yanomami e os Munduruku, já vivem sob efeitos diretos da exposição ao metal pesado liberado pelo garimpo ilegal.
O mercúrio — usado na extração clandestina de ouro — contamina rios, peixes e o organismo humano. Entre os efeitos mais comuns estão danos neurológicos, prejuízos cognitivos, risco à gestação e comprometimento da saúde infantil.
Atualização 2024–2025 — O que mostram os estudos mais recentes
1. Contaminação entre indígenas Yanomami
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Estudos da Fiocruz (2024) revelam que 100% dos indígenas testados tinham mercúrio no organismo.
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84% estavam acima do limite seguro recomendado pela OMS.
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Pesquisadores também encontraram mercúrio em todas as 14 espécies de peixe mais consumidas nas aldeias.
2. Diagnóstico nas terras Munduruku
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Em 2024, com a seca extrema, comunidades passaram a beber água diretamente de rios contaminados por mercúrio — aumentando drasticamente o risco de intoxicação.
3. Levantamento da WWF (2024)
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As bacias dos rios Tapajós, Xingu, Mucajaí e Uraricoera apresentaram risco “extremamente alto” de contaminação.
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Todas essas áreas ficam próximas ou dentro de territórios indígenas vulneráveis.
4. Alerta da liderança Alessandra Munduruku (2025)
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Ela relatou que até o leite materno de mulheres indígenas contém mercúrio, impactando diretamente recém-nascidos.
5. Relatório ABIN / MMA / FBSP (2025)
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Revelou redes internacionais de contrabando de mercúrio abastecendo o garimpo ilegal.
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O estudo mostra que comunidades indígenas estão entre as mais vulneráveis aos impactos tóxicos.
6. Manual técnico de saúde (lançado em maio de 2025)
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Elaborado pelo Ministério dos Povos Indígenas, Sesai, Fiocruz e Ministério da Saúde.
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Orienta equipes de saúde em diagnóstico, vigilância e atendimento especializado às populações expostas ao mercúrio.
Por que isso acontece?
O mercúrio usado em garimpos clandestinos é despejado nos leitos dos rios. Ali, microrganismos transformam o metal em metilmercúrio, sua forma mais tóxica. Esse composto contamina peixes e sobe pela cadeia alimentar até chegar às aldeias.
A falta de alternativa econômica também empurra indígenas e ribeirinhos para atividades vinculadas ao garimpo ilegal.
Por que só reprimir não resolve
Especialistas e órgãos internacionais destacam que o combate isolado não tem conseguido deter o garimpo ilegal.
Esse modelo gera três problemas:
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Desloca a atividade para novas áreas, agravando a destruição.
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Aumenta a violência e o controle de facções e milícias ambientais.
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Fecha portas para soluções técnicas, porque a atividade permanece na clandestinidade.
A proposta: legalizar sob regras rígidas + tecnologia limpa + fiscalização permanente
A formalização do garimpo é defendida por vários especialistas como forma de:
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controlar a atividade;
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retirar o mercúrio do processo de extração;
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regularizar trabalhadores;
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reduzir o crime organizado;
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gerar renda local com responsabilidade ambiental.
Pilares da proposta
Uso de tecnologias sem mercúrio
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Retortas para capturar vapores;
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Gravimetria (separa o ouro sem químicos);
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Equipamentos de alto desempenho já usados em países como Peru e Colômbia.
Licenciamento com limites rigorosos
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Áreas demarcadas;
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Registro obrigatório;
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Fiscalização constante com drones e satélites.
Crédito e capacitação
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Linhas de financiamento para equipamentos limpos;
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Treinamento de garimpeiros para operação segura.
Alternativas de renda sustentável
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Manejo florestal;
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Turismo comunitário;
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Piscicultura de baixo impacto;
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Pagamentos por serviços ambientais.
Monitoramento da saúde indígena
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Testes periódicos de mercúrio em comunidades e rios;
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Unidades móveis de diagnóstico;
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Atendimento especializado conforme o manual publicado em 2025.
Combate ao garimpo ilegal remanescente
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Articulação entre PF, Ibama, Funai e Forças Armadas;
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Bloqueio das rotas internacionais de mercúrio.
O que está em jogo
A Amazônia está diante de um dilema:
como garantir vida digna para quem vive na região, sem repetir o ciclo de destruição?
A legalização controlada — com tecnologia, fiscalização e políticas sociais — surge como alternativa capaz de:
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gerar emprego,
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evitar contaminação,
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reduzir o poder do garimpo ilegal,
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proteger povos indígenas,
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e preservar os rios.
O futuro da Amazônia depende de escolhas que unam economia, ciência, respeito aos povos originários e proteção ambiental. E essas decisões precisam ser tomadas agora.
- Leia mais:
https://gnewsusa.com/2025/11/semana-mundial-de-conscientizacao-sobre-resistencia-antimicrobiana/

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