
Frágil e sem base parlamentar sólida, o governo Lula vê o presidente da Câmara impor reformas duras e pressionar pelo ajuste fiscal que o Planalto não consegue tocar.
Por Gilvania Alves |GNEWSUSA
O decreto do governo que elevou o Imposto sobre Operações Financeiras (IOF) para tentar arrecadar cerca de R$ 20 bilhões em 2025 e R$ 40 bilhões em 2026 causou insatisfação no Congresso e no setor produtivo. A reação foi imediata: o presidente da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB), colocou em xeque a medida e sinalizou que o Legislativo está disposto a derrubá-la, aumentando a pressão sobre o Planalto.
“Seria mal recebido pelo Legislativo” um recurso do governo ao Supremo Tribunal Federal para manter o aumento, alertou Motta, expondo a perda de controle do Executivo sobre sua própria política fiscal.
A agenda de reformas que o governo tenta evitar
A ofensiva de Motta vai além do IOF. Ele propõe uma série de medidas estruturais para ajustar as contas públicas, como a revisão das renúncias fiscais — que já somam R$ 1,25 trilhão nos últimos anos —, a desvinculação dos gastos obrigatórios com saúde e educação e a retomada da controversa reforma administrativa.
Apesar da urgência fiscal, Lula evita firmar posição clara sobre esses temas. Sobre a desvinculação dos gastos, por exemplo, desconversou: “Eu não posso dar palpite sim ou não, eu preciso ver qual é a proposta que as pessoas estão discutindo.” A postura demonstra a insegurança do governo diante de medidas impopulares que podem desgastar ainda mais sua base.
Governo dividido e sem articulação eficiente
O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, que deveria liderar o esforço para negociar com o Congresso, perdeu força dentro do próprio governo. Ele prometeu apresentar um pacote alternativo para compensar o aumento do IOF, mas não cumpriu o prazo, deixando evidente a falta de articulação do Planalto.
“Estamos tendo esse cuidado todo porque nós dependemos dos votos do Congresso Nacional,” admitiu Haddad, mas o impasse revela que o Executivo está cada vez mais refém do Legislativo.
Câmara assume protagonismo na política econômica
Na falta de uma liderança forte do Executivo, o Congresso, sob a batuta de Hugo Motta, passou a ditar os rumos da política econômica. O cientista político João Lucas Moreira Pires observa que Motta aproveita o momento para se destacar: “Ele viu no IOF uma oportunidade de constranger o ministro da Fazenda e se afirmar como ator protagonista.”
Com Lula cada vez mais isolado e com rejeição crescente — pesquisas recentes indicam que mais de 55% da população desaprova seu governo —, o presidente da Câmara usa essa fragilidade para cobrar reformas que o Planalto evita enfrentar.
Reformas estruturais: missão quase impossível para o governo
A reforma administrativa, tão necessária para reduzir os custos do funcionalismo público, voltou ao debate, mas enfrenta resistência feroz dentro da base governista, que teme perder apoio popular.
Para a professora Graziella Testa, da FGV, a tentativa de Hugo Motta de empurrar essas reformas pode ser mais um gesto político do que uma ação efetiva: “Pode ser apenas uma sinalização. Ele sabe que, se houver impacto negativo, o desgaste será do presidente da República, não do Congresso.”
Conclusão: Lula entrega o comando da economia ao Congresso
O governo Lula se mostra incapaz de liderar a necessária agenda fiscal e reformista. Com uma base frágil e um ministro da Fazenda enfraquecido, o Planalto perde espaço para o Congresso, que assume um protagonismo até então incomum na formulação das políticas econômicas.
Hugo Motta, à frente da Câmara, busca deixar sua marca, enquanto o presidente da República assiste ao seu governo se desgastar politicamente, atolado em crises e sem capacidade de negociação.
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